Arte e Cultura
Conhecida pela imponência do seu vulcão, a ilha reserva aos seus visitantes lugares e atrações que valorizam a natureza e a cultura, oferecendo uma experiência única e inesquecível.
A ilha do Fogo, além de possuir um imenso valor naturalístico, herdou da sua história humana, começada há quase seis séculos, um outro grande patrimônio material e imaterial que faz com que os foguenses possam sentir-se orgulhosos de conservar e mostrar aos visitantes. Este património é constituído por seus inúmeros elementos artísticos, linguísticos, musicais, arquitectónicos e muito mais.
Deixem-se levar nesta maravilhosa viagem ao passado: ficarão encantados!
São Filipe a “Cidade dos Sobrados”
Um elemento que carateriza o património e a história da Ilha do Fogo, uma história que incorpora traços africanos, mediterrâneos, europeus e, mais recentemente, elementos americanos também, são os sobrados.
Em qualquer itinerário turístico, São Filipe é uma etapa obrigatória não só pela presença do pequeno aeródromo, mas por ser depositária e testemunha da época colonial portuguesa.
Os sobrados, antigas residências portuguesas, representavam o coração da vida cultural e económica da cidade que atualmente conta mais de 50 antigos prédios, alguns dos quais foram reabilitados por usos diversos, por exemplo hotéis e lojas.
Uma da herança da época colonial é a Festa de Nho São Filipe que acontece anualmente na época entre dias 25 de Abril a 1 de Maio, durante a qual a ilha recebe visitantes provenientes de diversas partes do mundo.
A Festa das Bandeiras em homenagem aos quatro santos – São Sebastião, São Filipe, São João e São Pedro – era, e ainda é, a festa máxima da ilha. As bandeiras representavam três categorias sociais aos quais marcavam a sua presença de forma distintas, neste importante ciclo festivo.
A verdadeira atração desta festa é representada pela oportunidade de voltar, por alguns dias, atrás no tempo, quando as mulheres de classe mais modestas se reuniam nos sobrados para preparar o milho, utilizando instrumentos antigos “Pilon e Midor”, e quando os homens de classe mais elevada podiam mostrar os seus imponentes cavalos durante as corridas organizadas pelas ruas da cidade.
Principalmente na zona baixa da cidade de São Filipe encontramos imponentes sobrados que atestam o estilo de vida de uma determinada época.
Atualmente existem 54 imponentes casas coloniais, que pela maior parte podem ser visitados com o acompanhamento dos guias turísticos locais. Esses edifícios surgiram num tempo em que a economia baseava-se sobretudo na agricultura e no comércio, atividades que determinaram, de certo modo, a configuração dessas construções, que constam de dois pisos, sendo o primeiro destinado a comércio e armazém e o segundo a habitação da família.
Os Sobrados do Fogo são réplicas das casas rurais portuguesas, tendo-se iniciado no interior das propriedades agrícolas e só mais tarde reproduzidas na cidade, com a degradação da produção agrícola.
Essas construções normalmente têm a forma de C ou L e são divididos da seguinte forma: o primeiro piso composto por loja, armazém e um pátio interior normalmente empedrado onde os serviçais da casa realizam os afazeres do dia-a-dia (debulha de milho e feijões, nalguns casos café, moagem do milho, etc.). Têm ainda um quintal exterior, térreo, aonde em regra ficam os animais. Em muitos casos eram providas de uma despensa e, nalgumas situações, um quarto para os criados mais próximos.
O segundo piso era para uso habitacional, destacando-se grandes compartimentos, bem mobilados e bem arranjados, com grandes portas, janelas e sacadas.
Os primeiros sobrados não dispunham de varanda, sendo que essas vieram a ser introduzidas mais tarde, por influência de imigrantes dos Estados Unidos da América, conforme com Fausto do Rosário, professor e experto em história e cultura local.
A sua estrutura arquitectónica é tipicamente portuguesa adaptada às condições climáticas, sociais e culturais de Fogo, sendo casas altas, de muitas portas, o que lhes confere um excelente arejamento e luminosidade, e poucas janelas, reproduzindo uma organização de funcionalidades muito corrente nas construções rurais portuguesas.
Os sobrados contêm todos uma história e um estatuto e eram objeto de comparação do nível de posse de cada família. Inicialmente eram propriedades dos portugueses, mas com a degradação económica, devido à redução da produção na agricultura, à perda das terras por razões várias e à diminuição da expressão do comércio, começaram a surgir alguns mulatos com posses que adquiriram por compra ou construíram de raiz um outro sobrado, sempre sob a reprovação da classe “branca”, conforme narrativa do famoso escritor Teixeira de Sousa.
Os sobrados contam a história de um tempo, mas não ficam por aí: são depositários do processo de evolução das classes sociais, que importa preservar para uso das gerações futuras.
Além dos sobrados, o tour através da cidade pode levar os turistas a visitar a Casa da Memória e o Museu Municipal, para conhecer a história da cidade e da Ilha de Fogo em geral, e a aproveitar outros pontos de interesse como o Cemitério de Baixo, conhecido também como Cemitério dos Brancos, datado de XIX século; os restos do Fortim Carlota, datados de XVII século; o animado mercado municipal e outros numerosos edifícios e praças que ainda conservam o fascínio da época colonial.
TOUR DOS SOBRADOS
Os projetos F.A.T.A e Rotas do Fogo, co-financiados pela União Europeia, no longo do desenvolvimento das varias atividades, identificaram o roteiro “Tour dos Sobrados”: um caminho que se desenvolve dentro do centro histórico de São Filipe e que permite aos turistas descobrir o legado deixado para a Ilha do Fogo desde a era colonial portuguesa.
Clique aqui para descobrir o “Tour dos Sobrados” e descarregar o mapa do Roteiro da Cidade de São Filipe…
Em São Filipe os turistas podem também aceder a Praia de Fonte Bila, uma praia particular de areia preta. Por causa da conformação da ilha e das fortes correntes oceânicas, é uma das poucas praias de Fogo, juntamente com a Praia do Porto de Vale dos Cavaleiros e a praia de Ponta Salina em São Jorge, famosa pela presença de piscinas naturais sugestivas.
Funco
O “Funco”, a típica casa que se pode admirar na localidade de Chã das Caldeiras ao pê do Vulcão Pico do Fogo, é uma construção circular de cobertura cônica feita de basalto e coberta com folhas de carrapato.
Edificado junto à casa de habitação, aí se preparam as refeições e se pila e se mói o milho. No passado já serviu também de residência para algumas famílias mais pobres.
Além do pilão e do moinho, encontramos também no interior do funco uma fogueira no chão, caldeirões enegrecidos pelo fogo dos cozinhados, cântaros de barro e balaios de fibra trançada.
Hoje os funcos têm coberturas de betão de cimento e utilizam-se para guardar utensílios de lavoura e fornecer abrigo as pessoas que trabalham no campo.
Música tradicional: Talaia Baxo… a alma de um povo
O género musical “Talaia Baxo” nasceu nos contextos populares mosteirenses nos inícios do séc. XVIII. E em todo o cenário encontrava-se presente nos momentos de convívio e lazer, manifestando-se de forma espontânea.
Reza a História que, nas imediações das zonas altas dos Mosteiros, isto é, contíguas ao perímetro florestal de Monte Velha, viveu um tal Armand Montrond na localidade de “Tchada Mariz ” ou Achada Maurício e com ele trouxe um instrumento chamado de violino cujas afinidades musicais com a música deu-se esse casamento tão perfeito que perdurou de gerações em gerações, quiçá, ultrapassará séculos de existência.
O violino francês, um instrumento clássico, da valsa francesa, a sua introdução no género “Talaia Baxo” veio enriquecer a melodia e a tonalidade existentes em cada verso expresso pelos músicos. Não há ”Talaia Baxo” sem violino o mesmo acontecendo, por exemplo… Não há “Funaná”, outro tipo de musica popular e dança, sem gaita. Esses instrumentos são imprescindíveis na orquestração e ênfase que trazem a esses géneros musicais.
“Talaia Baxo” evoca alma, o sentimento, a essência dos foguenses estejam onde estiverem, tanto no país como nas comunidades emigradas, cantando temas da saudade, a narrativa do quotidiano. “Talaia Baxo” associa-se aos outros géneros musicais da sociedade foguense, em contrapartida ditar-lhe-ia a comunhão dos músicos em dotar-lhe de um estatuto próprio vincando dos demais.
A partir do séc. XX, isto é, nos primórdios, “Talaia Baxo” conhece uma gradual e sistemática divulgação e consagração popular, através de nomes sonantes que vieram emprestar-lhe um outro brilho e musicalidade à música. Com efeito, o surgimento de consagrados músicos a partir dos anos 20, veio permitir a promoção e dinamismo de temas relacionadas com a mundividência cultural da ilha, embora não se registem gravações em discos nesta época para testemunhar o pioneirismo daqueles que tudo fizeram para a sua preservação.
No contexto da época, há de se destacar os expoentes desse gênero altura em que surgem vários músicos, na sua maioria, anônimos, sucessivamente transmitidos pela tradição oral, esta situação inverter-se-ia definitivamente a partir de meados do século passado, época em surge uma plêiade de músicos populares, tais como o Rei “Minó de Mámá, o Pai “Botista Lima” e a rainha de “Talaia Baxo”, Bina Manzinha de Ribeira do Ilhéu.
Paradoxalmente e em termos de curiosidade, os primeiros registos discográficos surgem na década de 70 com Frank Mimita, Frank Cavaquinho e Luís Morais no disco “ Hora dja Tchiga” e mais tarde o tão famoso disco dos “Apolos” no disco “Recordações” e a bela voz do “Secré” disco muito vendido na altura devida a música “Trabessado”, até hoje essa música agita os palcos e pistas de dança.
Já nos anos ‘90, “Talaia Baixo” consagrar-se-ia, definitivamente nos circuitos e moldes da World Music internacional com “Mendes Brothers” (Ramiro e João Mendes) tendo o grupo recebido vários elogios e prémios da crítica musical internacional. A música “Talaia Baxo” associa-se a um infinito versátil que a caracteriza, cada músico emprestou a sua classe poética ao género, mas entretanto, temos de realçar em termos de justiça musical realçar àqueles que ao longo dos tempos imortalizaram a alma e o ser “Djarfogo”: Bocarron (Félix Lopes, Jorge Senna, Gudin, Nenelo e José Pedro), Quirino do Canto, Irmãos Unidos da Brava, Show de Pina, Éder Monteiro, Filipe Rodrigues e todos aqueles que amam essa música tão bonita e alegre.
(António Félix Lopes, Músico da Ilha do Fogo)
A comunidade de Chã das Caldeiras
As primeiras pessoas a fixarem-se nesta zona fizeram-no no início do século XX, por volta de 1917. A ausência de erupções desde meados do século XIX encorajou os habitantes da ilha a subir o vulcão e a dominar o seu território.
Antes do início da erupção de 2014-2015 viviam aqui cerca de 1300 pessoas: uma comunidade distinta e peculiar, unida por estreitos laços familiares e intimamente ligada ao vulcão.
Após a última erupção do Vulcão Pico do Fogo a comunidade voltou a viver na caldeira, por volta de 500 habitantes, trabalhando principalmente na agricultura e no turismo.
Uma comunidade com um grande espírito de resiliência e resistência, devido a uma alma ligada ao vulcão e a grande capacidade de renovação das vidas depois da última erupção vulcânica.
Em Chã das Caldeiras combina-se agricultura de sequeiro com pecuária e o famoso Vinho do Fogo è produzido aqui, nas vinhas plantadas em cinza vulcânica. È também uma área fértil e apropriada para o cultivo de vegetais e de árvores de fruto, tais como marmelos, figueiras, macieiras e romãzeiras, já que as características edáficas e as condições climáticas de maior umidade, favorecem estas colheitas. Também se faz criação de gado, sobretudo de cabras.
Este cenário peculiar è detentor de muitos endemismos de flora e fauna, e também de uma paisagem de elevado interesse geológico.